ZERO HORA - 09 de maio de 2010 - ARTIGOS
Delitos e dislates, por Flávio Tavares
*A era em que vivemos atende pelo nome de pós-modernidade. Estamos tão além dos dias de hoje, que a pressa não arranjou palavra melhor para estes tempos em que tudo cai de roldão, rápido, e até os dias deixaram de ser vagarosos. Nas eras anteriores, para saber de crimes ou absurdos era necessário pesquisar bibliotecas inteiras e, na voragem da leitura, conhecer as condutas. Hoje, basta ler os jornais.
Todos os disparates estão ali, como notícia sobre os que mandam. Nestes dias de maio, pinço ao acaso alguns deles, sem tocar em nossos dislates crioulos no Rio Grande, para que não sirvam de modelo a toda a Terra.
Primeiro, o ministro da Saúde soltou a fórmula de combate à hipertensão arterial e adjacências: ter relações sexuais cinco vezes ao dia! De imediato, percebeu o exagero (ou o equívoco) e emendou para “cinco vezes por semana”. O médico Gomes Temporão é figura respeitável no ministério medíocre que nos governa de Brasília, mas nos fez lembrar o seu chefe, o presidente da República, tempos atrás, dizendo que o problema do Brasil “já não é a fome, mas a obesidade”.
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Depois, uma fragata da Marinha de Guerra, com radar, sonar e demais modernidades (mísseis antiaéreos e navais, canhões, torpedos e foguetes antissubmarino), encalhou junto à praia em Arraial do Cabo, no Rio de Janeiro. Nenhum dos 200 tripulantes percebeu os bancos de areia que os pescadores da região conhecem pela cor do mar.
Logo, revelou-se que a Igreja Universal do Reino de Deus enviou ao Exterior quase meio bilhão de reais entre 1995 e 2001. A revelação, feita por uma casa de câmbio ao Ministério Público de São Paulo, confirmou depoimento similar prestado à promotoria de Nova York, que investiga a transmutação da igreja em empresa financeira nos EUA. Quanto terá enviado nos últimos anos, quando as mágicas dos milagres decuplicaram e seus templos se encheram como casa lotérica em dia de Mega Sena acumulada?
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O disparate da política exterior do Brasil face ao Paraguai reapareceu no encontro dos presidentes de ambos os países. Anos afora, o Itamaraty apoiou a longa ditadura do general Stroessner e, assim, também a corrupção que institucionalizou, hoje transformada em máfia que rouba, falsifica e mata. Centenas de brasileiros motoristas de caminhão foram mortos dentro do Brasil e seus veículos e mercadorias levados ao Paraguai, sob amparo da corrupção oficial.
Nada fizeram as autoridades brasileiras. Agora, no encontro com o presidente Lugo, Lula da Silva parecia mais preocupado em proteger o urânio enriquecido do Irã de Ahmadinejad do que em combater a rica máfia paraguaia.
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Haverá, porém, disparate maior que o envolvimento do todo-poderoso secretário nacional de Justiça, Romeu Tuma Júnior, com o megacontrabandista chinês Li Kwok Kwen, conhecido delinquente de colarinho e gravata, ora preso em São Paulo?
Os telefonemas de Tuma Júnior (reproduzidos no rádio e na TV) pedindo-lhe as mais recentes modernidades contrabandeadas mostram intimidade absoluta. Antes, Li foi “assessor parlamentar” de Tuma quando deputado estadual pelo PTB em São Paulo. Que tipo de assessoramento devia prestar?
O que dirá disto o ex-ministro Tarso Genro, em cuja gestão o poder de Tuma se multiplicou como executor das ações do Ministério da Justiça? Ou não há momentos em que dislate e delito são uma coisa só?
*Jornalista e escritor
PS.: o negrito é meu.
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